Cinco dos seis mortos no PI no fim de semana tinham passagem pela polícia, diz secretário; pesquisador alerta para culpabilização das vítimas
04/11/2024
Secretário de Segurança Chico Lucas comentou fim de semana de mortes violentas no estado e destacou medidas de prevenção aos crimes. Ao todo, quatro pessoas foram mortas em Teresina, uma em Palmeirais e outra em Ilha Grande. Viatura do Instituto Médico Legal (IML) do Piauí
Lucas Barbosa/G1 PI
Dos seis homicídios registrados entre sábado (2) e domingo (3), no Piauí, cinco foram de pessoas que já foram presas ou tinham envolvimento com organizações criminosas, afirmou o secretário estadual de Segurança Chico Lucas. Apenas o homem que matou o irmão e tirou a própria vida não tinha passagem pela polícia.
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O secretário comentou o fim de semana de mortes violentas durante entrevista ao Bom Dia Piauí, da TV Clube, nesta segunda-feira (4). Ele ainda destacou que dois homens assassinados utilizavam tornozeleira eletrônica - ou seja, foram presos e liberados sob monitoramento.
“O que morreu no posto de gasolina provavelmente foi morto por intervenção policial. Um policial reagiu ao assalto e o baleou. Ele usava uma tornozeleira. O do Parque Alvorada foi preso em 23 de outubro e solto no dia seguinte, também com tornozeleira. Se estivessem no sistema carcerário, teríamos evitado essas mortes”, apontou o secretário Chico Lucas.
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O g1 conversou com o sociólogo Marcondes Brito, pesquisador de segurança pública, que discorda do posicionamento do secretário. Para o professor, a manutenção de criminosos no sistema prisional não garante que eles não sejam mortos, pois também há assassinatos dentro das prisões (leia mais abaixo).
Marcondes também criticou a falta de um plano estadual de segurança, cujo projeto é debatido há dois anos (saiba mais). Sobre as medidas de prevenção aos crimes violentos, como investimentos em educação e geração de emprego, ele questionou se o perfil das pessoas assassinadas se encaixa nesses projetos (confira abaixo).
Entenda a linha do tempo da violência no Piauí:
O primeiro assassinato foi registrado na manhã do sábado (2), quando um irmão matou o outro e depois cometeu suicídio na Zona Sudeste de Teresina;
Cerca de cinco horas depois, um homem morreu baleado próximo a um posto de gasolina, também na Zona Sudeste da capital. O morto usava tornozeleira;
Por volta das 14h de sábado (2), Davi Almeida da Silva, de 28 anos, foi morto com um tiro na cabeça na Vila Dagmar Mazza, Zona Sul de Teresina;
Uma hora e meia depois, ainda no sábado, houve um tiroteio em Ilha Grande em que Felipe Pereira Coutinho foi morto. Quatro homens foram presos e uma adolescente apreendida suspeitos dos crimes;
Na manhã de domingo (3), Francisco Danilo Almeida dos Santos, de 39 anos, foi assassinado a tiros no bairro Parque Alvorada, Zona Norte da capital. Ele usava tornozeleira;
O sexto assassinato, que tirou a vida de Marcos Sabino Alves de Oliveira Filho, aconteceu durante a manhã de domingo, em Palmeirais.
Além dos assassinatos, houve quatro tentativas de homicídio no fim de semana:
Um homem baleado próximo ao posto de gasolina no bairro Alto da Ressurreição, Zona Sudeste de Teresina, na tarde de sábado (2);
O irmão de Felipe Pereira Coutinho, baleado durante o tiroteio no bar de Ilha Grande, ainda no sábado;
Um jovem chamado Josué Oliveira Teixeira, de 24 anos, esfaqueado no abdômen em um bar de Esperantina, na tarde de domingo (3);
Um homem identificado apenas como Gabriel, que conseguiu escapar de um tiroteio no bairro Mafrense, Zona Norte de Teresina, na noite de domingo. O 9º Batalhão de Polícia Militar (BPM) encontrou 12 munições disparadas no local. Ele não ficou ferido.
Segundo o secretário Chico Lucas, Marcos Sabino, assassinado em Palmeirais, e Felipe Coutinho, morto em Ilha Grande, também já passaram pelo sistema prisional. Felipe, inclusive, estava solto após ser preso por uma tentativa de homicídio.
“A pessoa que tentar matar outra comete um crime sério, tem uma pena maior. É importante que ela seja encarcerada para responder por isso. Quando não há responsabilização e ela é solta, você estimula a escalada da violência. Não queremos responsabilizar outros poderes, mas discutir a necessidade de um pacto para fortalecer o sistema”, ressaltou o secretário.
Por outro lado, o doutor em sociologia Marcondes Brito entende que o debate não pode ser desviado para uma culpabilização das pessoas assassinadas. Ele observou que homicídios também acontecem no sistema prisional, que sofre influência das organizações criminosas que atuam fora dele.
O especialista citou dois elementos presentes nas mortes no fim de semana - o monitoramento eletrônico e a circulação de armas ilegais - como indícios de que apenas as ações estatais não são suficientes para impedir os crimes violentos.
“Se você sabe que um suspeito está jurado de morte ou há a possibilidade dele ser assassinado, e ele está monitorado, ele morre sob uma medida de tutela do estado. Se eles foram mortos por armas que estavam circulando e não deveriam, temos uma política falha de apreensão de armas”, considerou Marcondes.
Redução de homicídios
Chico Lucas fala sobre PEC da Segurança e redução dos homicídios no Piauí
O secretário também falou a respeito dos dados de redução das mortes violentas no mês de outubro, divulgados pela Secretaria de Segurança Pública (SSP) na última sexta-feira (1º). Teresina teve uma queda de 50% e Parnaíba, de 60% em relação aos números registrados em outubro de 2023 e 2022. Confira abaixo:
Queda de mortes violentas em Teresina
Queda de mortes violentas em Parnaíba
Na visão de Chico Lucas, para que o combate às organizações criminosas - envolvidas nos crimes violentos - seja mais eficaz, há a necessidade de reforma em leis abaixo da Constituição Federal, como o Código Penal, Código de Processo Penal, Lei de Execução Penal e Lei da Lavagem de Dinheiro.
“A sensação é de que enxugamos gelo, prendemos e eles continuam soltos. Não é só culpa da Justiça, que tem que aplicar as leis. A gente tem que mudar as leis. Uma série de normas deve ser atualizada para fazer um combate efetivo ao crime organizado”, observou o secretário de Segurança.
O professor Marcondes Brito argumentou, no entanto, que não é possível afirmar que esses dados têm ligação direta com as ações da SSP. Ele lembrou que a pasta ainda não apresentou um plano estadual de segurança pública, que seria essencial para pensar as políticas destinadas à área.
As operações realizadas pela secretaria contra grupos criminosos, na opinião do especialista, não trazem resultados concretos e não servem para conter o número de homicídios no estado.
“Eles avisam aos criminosos que as operações estão acontecendo, perdem o fator surpresa. Por outro lado, os criminosos se organizam, dominam territórios e decretam condutas como a proibição de roubo e crimes contra a mulher. Se houver violência, a polícia aparece e o comércio [ilegal] é reduzido ou um traficante é preso”, refletiu o sociólogo.
Medidas de prevenção
ENEM 2024 - DOMINGO (3) – TERESINA (PI) – Abertura portões local de prova na Zona Norte de Teresina
Izabella Lima/g1
Chico Lucas citou dois caminhos para prevenir o aumento das mortes violentas no estado: educação e geração de empregos. Ele destacou a meta alcançada pela Secretaria Estadual de Educação (Seduc), que conseguiu matricular 100% dos alunos do 3º ano do ensino médio da rede pública de ensino no Enem 2024.
O secretário de Segurança mencionou ainda um projeto realizado em parceria com a Seduc que mapeia as ameaças e vulnerabilidades de 90 mil estudantes das escolas estaduais. Os casos são abordados pelas direções das escolas, o Conselho Tutelar e a polícia.
“Tivemos a percepção de aumento da violência de gênero. Muitos casos de estupro dentro do ambiente familiar, com 311 meninas e adolescentes sofrendo ameaças e vulnerabilidades nesse quesito. Percebemos também cerca de 300 órfãos de feminicídios. Estamos fazendo esse trabalho multidisciplinar de prevenção”, completou o gestor.
Novamente, o sociólogo Marcondes Brito questiona se pessoas como as que foram assassinadas no fim de semana se encaixam no perfil dos projetos de geração de emprego e renda.
O professor destacou que o país tem um dos piores índices de reinserção social de pessoas presas da América Latina. Segundo o Relatório de Informações Penais (Relipen) do Ministério da Justiça, divulgado em outubro deste ano, 24% da população carcerária do Brasil trabalha e 18% está no ensino formal (alfabetização, ensino fundamental/médio/superior e curso técnico).
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